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A origem de tudo


Por Caio Gottlieb*



Para entendermos, de cabo a rabo, como o Brasil chegou a essa inédita, surpreendente e gravíssima crise com os Estados Unidos, é imprescindível voltarmos brevemente no tempo.

Essa viagem vai nos levar ao Palácio da Justiça, a sede do Supremo Tribunal Federal. É dali que vai brotar a instabilidade institucional e a polarização política que hoje divide o país.

Sentenciado na Operação Lava Jato a mais de 12 anos de cárcere por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, Lula ficou 583 dias na cadeia e foi posto em liberdade em 2019 por decisão do STF, baseada em um novo entendimento da prisão em segunda instância, criado na medida para beneficiá-lo.

Era um desfecho mais do que esperado, e até demorou. Afinal, o STF foi aparelhado majoritariamente por ministros nomeados por ele e por Dilma Rousseff.

Logo em seguida, a Corte tira da cartola nova e escandalosa artimanha jurídica para anular todas as condenações do líder do gigantesco esquema que saqueou bilhões de reais da Petrobras.

Vamos recapitular: a pena imposta ao petista, respaldada por um robusto e insofismável conjunto de provas, havia sido confirmada anteriormente por três instâncias judiciais (incluindo o próprio STF) e por mais de uma dezena de magistrados.

Frise-se, a bem da verdade, que Lula nunca foi absolvido e nem inocentado dos crimes que cometeu. Foi simplesmente descondenado por uma falácia processual que escarneceu da lei a serviço de um projeto de poder já em gestação.

Reabilitado pela canetada, o petista volta ao jogo.

Jair Bolsonaro, então presidente, torna-se o obstáculo. E a máquina judiciária inicia o que se tornaria um implacável cerco institucional. O ministro Alexandre de Moraes assume o protagonismo. Ele e outros colegas da Corte usurpam prerrogativas do Executivo, bloqueando ações do governo. Apropriam-se das funções do parlamento, reinterpretam leis a seu bel-prazer e afrontam a Constituição.

Moraes avança no autoritarismo e lança medidas que suprimem a liberdade de expressão. Impõe censura a órgãos de imprensa, jornalistas e cidadãos que ousam divergir de suas decisões monocráticas e faz da Corte uma autêntica trincheira ideológica.

Durante todo o mandato de Bolsonaro, o Supremo se comporta como um ator político. O presidente reage, atacando, denunciando e confrontando.

Etapa fundamental do plano, a eleição de 2022, sob o olhar vigilante do Tribunal Superior Eleitoral, transcorreu como uma partida em que o juiz jogava de uniforme, adotando resoluções amplamente favoráveis ao candidato do sistema e adversas ao presidente da República.

As tentativas de transparência no processo eleitoral foram todas solapadas pelo STF. Em 2021, o ministro Luís Roberto Barroso, à época presidente do TSE, chegou a ir pessoalmente ao Congresso Nacional pressionar os parlamentares para impedir a aprovação do voto impresso. E teve êxito.

A toga mostrou claramente quem estava mandando no país.

Ungido pelas urnas eletrônicas, Lula retorna à presidência, instala no poder o condomínio PT-STF e fica acordado que tudo aquilo que ele não conseguir no Congresso a Corte lhe dará, e tudo aquilo que o Congresso lhe tirar, o Supremo lhe restituirá. Não é isso que estamos vendo?

Ninguém há de olvidar, aliás, a emblemática cena do presidente da Corte, ministro Barroso, no palco de um congresso estudantil, bradando: “Nós derrotamos o bolsonarismo!”

Em uma relação direta de causa e efeito, a descondenação de Lula dá início a uma cascata de absolvições, anulações e prescrições que sepultaram a Lava Jato.

O Brasil viu, estarrecido, os delatores e réus confessos devolvendo o dinheiro roubado, mas sendo tratados como vítimas.

Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski chefiaram o desmonte, transformando o maior esforço anticorrupção da história do país em uma farsa institucional, com decisões que engordaram as contas bancárias de escritórios de advocacia comandados por familiares de ministros, convenientemente contratados para defender os corruptos.

Gerada pelo inconformismo de ver a impunidade triunfar e de assistir a volta vitoriosa da bandidagem ao Palácio do Planalto, a indignação popular, ignorada e criminalizada, explode em 8 de janeiro nos atos de vandalismo em Brasília, imediatamente usados como pretexto para a instauração de um típico regime de exceção sob o falso argumento de proteger a democracia de uma fantasiosa tentativa de golpe de estado, que seria a primeira do mundo a ocorrer sem soldados e tanques nas ruas.

Vieram inquéritos policiais politicamente orientados, prisões sem julgamento, cerceamento à atuação de advogados, exclusão de conteúdos nas mídias digitais, suspensão de perfis nas redes sociais, perseguição a jornalistas, parlamentares e cidadãos, condenações absurdas e um rol de arbitrariedades sem fim.

No centro dessa engrenagem perversa, Alexandre de Moraes assumiu o papel de polícia, promotor e juiz — um superpoder que os demais ministros toleram por omissão, conveniência ou medo.

Para piorar o quadro, em movimento nocivo aos interesses do país, Lula começa a conduzir a política externa brasileira rumo ao que há de mais tóxico no planeta.

Alinhou-se à China, à Rússia e ao Irã, teve o desplante de culpar a Ucrânia por ter sofrido a covarde invasão do exército de Putin, renovou sua simpatia pelos grupos terroristas Hamas e Hezbolah e criticou ferozmente os Estados Unidos pelo providencial bombardeio às instalações nucleares dos aiatolás, entre outras velhacarias que envergonham o Brasil.

Paradoxalmente, enquanto fazia discursos em defesa da soberania e do respeito mútuo entre nações, Lula interferia diretamente em processos políticos alheios.

Apoiou o candidato peronista na eleição argentina, opinou na eleição americana atacando Donald Trump e declarando simpatia por Kamala Harris. Ignorou os crimes da ditadura de Nicolás Maduro, desprezou a oposição venezuelana perseguida, e recebeu o ditador com tapete vermelho e afagos diplomáticos.

O princípio da não interferência, tão proclamado nos discursos, dissolveu-se na prática da conveniência ideológica.

Por último, o demiurgo resolveu brincar de potência, defendendo o fim do dólar como moeda-padrão internacional (nem Putin e Xi Jinping ousaram tanto) e promovendo os BRICS como alternativa de poder global.

Quando todo mundo pensava que o presidente Donald Trump não estava dando muita bola para os desaforos do petista, ele vira suas baterias para o Brasil.

Fiel à sua sólida afinidade pessoal e ideológica com Bolsonaro, passa a denunciar a perseguição judicial sofrida pelo aliado e a cobrar explicações. Em resposta, Lula adotou uma postura beligerante, desprezando qualquer tentativa de diálogo.

Enquanto potências globais negociam tarifas e protegem seus interesses, o presidente brasileiro reage com palavras duras, bravatas diplomáticas e frases de efeito. Uma formiguinha puxando briga com o elefante.

E Trump, como quem decide que a paciência acabou, lança a bomba: tarifa de 50% sobre produtos brasileiros — com direito a cobrança explícita por mudanças institucionais.

Percebendo que a retórica de enfrentamento desperta instintos patrióticos difusos e rende uma ligeira melhora nas pesquisas que mostram sua popularidade decadente, Lula resolve abraçar o confronto como estratégia, apropriando-se da bandeira nacional com um oportunismo rasteiro.

Passa a vender bravura onde só há cálculo eleitoral. Transforma o embate em palanque — e o palanque em prioridade absoluta.

Como se não bastasse, Alexandre de Moraes, num timing certamente articulado com o Planalto, determina medidas humilhantes contra Bolsonaro: tornozeleira eletrônica, censura de redes e restrições arbitrárias, em uma operação sem base legal, interpretada como provocação a Trump.

E então vem a marretada: o anúncio oficial, feito pelo secretário de Estado Marco Rubio, do cancelamento imediato dos vistos de entrada nos Estados Unidos para ministros do Supremo Tribunal Federal e seus respectivos familiares — com exceção de Luiz Fux, Nunes Marques e André Mendonça. A punição atinge também o procurador-geral da República e o diretor-geral da Polícia Federal. Uma sinalização inequívoca de que o governo americano não está para brincadeira. E há sinais de que vem mais coisa por aí.

A pergunta agora é: até onde pretendem ir os tiranos que se apossaram dos destinos do país?

Estariam dispostos a ir às últimas consequências da irresponsabilidade, empurrando o Brasil rumo ao caos econômico de uma ruptura com os Estados Unidos — maior potência global, principal investidor estrangeiro no país e nosso segundo maior parceiro comercial — apenas para sustentar uma hegemonia disfarçada de democracia?

Como disse alguém: quem joga pôquer com o dono do cassino sempre perde. E o dono do cassino, neste momento da história, tem nome — e endereço em Washington.

Tal qual vozes pregando no deserto, alguns dos mais renomados e respeitados juristas brasileiros já vinham alertando para a irrefreável escalada autoritária da suprema Corte.

Antes calados por omissão, temor ou covardia, diversos setores e entidades da sociedade civil organizada, como a OAB de São Paulo, começaram recentemente a pedir contenção ao judiciário.

O problema é que deixaram o gênio escapar armado da garrafa e, ao menos por bem, não há mais como enfiá-lo de volta.

Há quem diga que talvez seja mesmo necessária a pressão de uma força externa, de uma nação historicamente amiga do povo brasileiro, não do atual do governo, para recolocar o país nos trilhos da normalidade institucional.

Recuperar a liberdade agora poderá custar muito caro. Mas ela não tem preço.


*Jornalista, publicitário, fundador e sócio-proprietário da Caio Publicidade, agência de propaganda com mais de três décadas de atuação em Cascavel e no oeste do Paraná. Paranaense de Pato Branco, Caio Gottlieb é um dos pioneiros do telejornalismo no interior do Estado. Atuando na TV Tarobá desde os primórdios da emissora, ele produz e apresenta o tradicional programa de entrevistas Jogo Aberto, um dos mais tradicionais programas de entrevistas da TV brasileira, que está na grade da emissora desde a sua fundação em 1979.

Fonte Extra

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