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“Coloquem-no no divã”

Ilustração (C.G.)


Por Caio Gottlieb*

O que se passa na mente de Alexandre de Moraes? A pergunta, formulada com elegância cortante pelo ex-ministro Marco Aurélio Mello, é o diagnóstico mais preciso já feito sobre o estado febril da Suprema Corte brasileira — ou, para ser mais exato, sobre a perigosa hipertrofia de um único de seus membros.

“Teria que colocá-lo em um divã e fazer uma análise do que ele pensa, o que está por trás de tudo isso”, disse Mello, em entrevista ao Estadão. E se a frase escandaliza, é apenas porque nos acostumamos demais com a anomalia.

Há tempos Alexandre de Moraes abandonou o figurino da magistratura para vestir a couraça de inquisidor. Conduz inquéritos como se fossem campos de batalha, ignora princípios elementares do devido processo legal, distribui censuras como se fossem balas de borracha, e reduz a Constituição à extensão de sua própria vontade. O Supremo, sob sua pena, virou tribunal de exceção disfarçado de guardião da democracia.

Mas o que torna essa escalada ainda mais inquietante é o silêncio.

Um silêncio cúmplice, seja por medo, seja por conveniência. Em conversas reservadas, ministros do Supremo Tribunal Federal admitem incômodo com o tensionamento promovido por Moraes na condução do inquérito sobre a suposta “tentativa de golpe”.

Avaliam que os excessos só inflamam o caso, ampliam o desgaste da Corte e arranham, com tintas grossas, a legitimidade institucional. Mas ninguém vem a público. E a pergunta se impõe: por quê?

Seria o velho espírito de corpo? Medo de virar alvo do colega armado com caneta e inquéritos infinitos? Ou apenas a aposta cínica de que, abrindo-se esse precedente agora, todos poderão usufruir do mesmo poder discricionário amanhã? O silêncio, quando vem de juízes, não é neutralidade. É adesão.

Marco Aurélio, agora alforriado das pressões internas do tribunal, não poupa palavras. Chama a fase atual de “extravagância institucional”. Aponta a atuação do STF como “excessivamente incisiva” e alerta que medidas como tornozeleira eletrônica e restrições à comunicação ditadas por Moraes contra o ex-presidente Jair Bolsonaro impõem uma “mordaça” e configuram censura prévia — termos impensáveis num Estado que se pretende democrático. “Ele proibiu diálogos. Mordaça, censura prévia, em pleno século que estamos vivendo. É incompreensível”, sentencia o decano aposentado.

Sua crítica atinge o ponto nevrálgico do debate: o Supremo não deveria sequer estar julgando Bolsonaro, diz ele, relembrando que o então réu Lula foi processado na primeira instância. “O que começa errado não pode acabar bem. […] A história é impiedosa, vai cobrar essa postura do Supremo.”

Vai cobrar mesmo. Porque nenhum poder dura para sempre — muito menos os poderes que nascem do arbítrio e da exceção. E quando a balança da Justiça é substituída pelo tacape do justiçamento, não há toga, cargo ou prestígio que proteja seus autores do julgamento mais implacável de todos: o da memória nacional.

Enquanto isso, Alexandre de Moraes segue imune à crítica, absoluto em sua cruzada contra os inimigos de sua narrativa.

Um ministro que já não atua como julgador, mas como operador de uma justiça paralela — uma que se acha autorizada a calar vozes, manipular procedimentos e reescrever as regras do jogo.

O problema, diria o pai da psicanálise, é que quando o ego se perde entre o delírio de controle e o instinto de punição, o sintoma se impõe à razão — e a toga vira disfarce de compulsão.

Enfim, só Freud explica. Ou talvez nem ele.


*Jornalista, publicitário, fundador e sócio-proprietário da Caio Publicidade, agência de propaganda com mais de três décadas de atuação em Cascavel e no oeste do Paraná. Paranaense de Pato Branco, Caio Gottlieb é um dos pioneiros do telejornalismo no interior do Estado. Atuando na TV Tarobá desde os primórdios da emissora, ele produz e apresenta o tradicional programa de entrevistas Jogo Aberto, um dos mais tradicionais programas de entrevistas da TV brasileira, que está na grade da emissora desde a sua fundação em 1979.

Fonte Extra

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